O rego da Jove

12/02/2019 | Luiz Mascarenhas

Trata-se de verdade inexorável. Tão logo o firmamento concentra-se  de nimbus, cirrocumulus e cirrostratos, que a forte precipitação pluviométrica desaba imperiosa sobre as barrancas de Sant’anna e o rego entope.

Ei-lo: o rego atochado! De água….

Nas peripécias da modernidade, o rego entumecido pelas torrentes vira alvo fácil de selfies e pequenos vídeos de incautos transeuntes ou moradores das cercanias, que o vislumbram das lentes de seus celulares e o postam de inopino nas múltiplas redes sociais como películas hollywoodianas da tragédia barranqueira.

O rego entupido! “Ó tempore! Ó mores!”

De súbito, erguem-se as mais variadas e pitorescas ponderações. Ora, ora, afinal, porque o rego entope?

Nada mais desconfortável do que o rego obstruído. Desembargue-se o rego!

As autoridades constituídas da municipalidade logo se reunirão em torno do rego. O rego será estudado, esquadrinhado, pesquisado…milimétrica e cartesianamente! Talvez até uma legislação surja para regular o uso do rego. O que é preocupante, em um país tão engarrafado por um cipoal de leis que surja mais uma – mesmo que municipal – regulando os regos por aí. Emergirão passeatas pelo “rego livre”. Bem, sendo um rego público, deverá mesmo vir regulado. Já os regos privados, que sejam utilizados como se aprouver a seus proprietários- desde que, sem prejuízo para as regueiras públicas de Blackstone City. Enfim, chega-se ao conclusório de que cada um cuide do seu rego e deixe a vala do outro em paz.

O rego da Jove é antológico. Já foi aberto. Desnudo aos olhos do público, sem causar vexames; contudo causava náuseas devido ao odor pútrido que se lhe exalava. Era um rego mau cheiroso. Contudo, veio do ilustre Prefeito Antônio Augusto de Lima Coutinho o sonho visionário de que ali, nos fundos dos quintais, brotaria entre as bananeiras e os frondosos pés de manga, a mais concorrida via da cidade. E o rego seria devidamente tapado. Mal sabia que tapado e entupido…

Pobre Cel. Jove Soares (1868-1953) ver seu nome associado a enchentes de águas furtadas nada poéticas e empesteadas. Pois a tempo seco, vê-se ratazanas e baratas e outros indivíduos do reino dos artrópodes e afins, disputando o espaço com os viandantes da prainha. Isso sem falar dos fiéis discípulos da seita “crossfit”, que anda operando milagres na terrinha, que por ali correndo, desviam dos camundongos como se barreiras móveis fossem- deve ser bem divertido!

Não nos cabe apurar os culpados. Não são de agora os problemas da Avenida Jove Soares. Colhe-se hoje a má ocupação do solo das adjacências do Córrego do Sumidouro. O nosso “Arrudas” tupiniquim. Toma-se da Natureza e ela requer de volta seu espaço.

Cuidemos pois do rego da Jove. Afinal de contas, durma-se com um barulho desses. Rego limpo, povo feliz!

“Après nous le déluge…”

 

 

*Bacharel em Direito / Licenciado em História pela UNIVERSIDADE DE ITAÚNA

  Historiador/ Escritor/ Membro Fundador da ACADEMIA ITAUNENSE DE LETRAS/

Autor de “Crônicas Barranqueiras” e coautor de “Essências”, “Olhares Múltiplos” e

 “O que a vida quer da gente é coragem”/

Diretor da E.E. “Prof. Gilka Drumond de Faria”

Cidadão Honorário de Itaúna

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