Três anos após a tragédia de Brumadinho, na região metropolitana de Belo Horizonte, familiares das 270 vítimas ainda aguardam por justiça. Desde o dia do rompimento, em 25 de janeiro de 2019, os órgãos competentes agem, mas com o imbróglio judicial ninguém foi condenado.
Em janeiro de 2020, após um ano de investigação, o MPMG (Ministério Público de Minas Gerais) apresentou denúncia contra a Vale e a Tuv Süd, empresa alemã que fez o laudo de estabilidade da barragem, além de 16 pessoas relacionadas ao rompimento. Entre elas, o então diretor da mineradora, Fábio Schvartsman.
O documento de 14 mil páginas foi aceito pela Justiça mineira, e os acusados responderiam por crimes contra fauna, flora, poluição, além do homicídio doloso das vítimas. Entretanto, em outubro de 2021, o STJ (Superior Tribunal de Justiça) extinguiu o processo e passou a competência do julgamento para a Justiça Federal.
Na decisão, a sexta turma do STJ afirma que as declarações de estabilidade da barragem, apresentadas ao antigo DNPM (Departamento Nacional de Produção Mineral), uma autarquia federal, seriam ideologicamente falsas e que os acusados teriam omitido informações essenciais à fiscalização da segurança da barragem ao não fazê-las constar no sistema de dados acessado pela ANM (Agência Nacional de Mineração).
Além disso, eles teriam causado danos a sítios arqueológicos que são bens da União e por isso a Justiça mineira não poderia julgar o caso. Foi a defesa de Fábio Schvartsman que entrou com a ação. Na época, o MPF (Ministério Público Federal) não concordou com a mudança de foro.
“O Ministério Público estadual não descreve nenhum crime federal. E, se o órgão não descreve, não há de se falar em competência da Justiça federal. A defesa não pode querer que o Ministério Público descreva o crime conforme ela entende melhor”, explica a subprocuradora da República, Luiza Frischeisen.
Mais um crime foi incluído na denúncia do MPMG, o de falsidade ideológica. “É mais um crime para serem julgados, até para justificar a competência federal. Isso pode até piorar a situação deles”, diz Paulo Crosara, especialista em direito penal. Os procuradores mineiros levaram o caso para o Supremo Tribunal Federal no dia 14 de janeiro.
Em novembro do último ano, a Polícia Federal também pediu o indiciamento da Vale, da Tuv Süd e de 19 pessoas. Mas o MPF informou que só vai decidir o que fazer depois do julgamento do recurso no Supremo. O jurista comenta que o órgão pode fazer uma nova denúncia ou pode confirmar a que já foi apresentada.
A espera das famílias
A tragédia de Brumadinho deixou 270 mortos. Desses, seis ainda não foram identificados. Um deles é Maria de Lurdes da Costa Bueno. Ela passava férias com a família na Pousada Nova Estância, que foi soterrada pela lama de rejeitos.
“Todos os dias eu gostaria que fosse o dia [que fosse encontrada]. É muito estranho pensar que passaram três anos”, conta a filha da vítima, Patrícia Borelli, que mora nos Estados Unidos. Ela soube que a mãe estava hospedada ali dois dias após a tragédia e visitou o local algumas vezes desde o rompimento da barragem.
“Antes de conseguir lembrar a pessoa e ir para aquele lugar de memória, você está pensando no que aconteceu, no aspecto de quem é o responsável, de que foi uma morte violenta e que a pessoa que você ama tanto pode ter morrido em uma coisa horrível”, conta a filha.
Outra vítima da tragédia é o operador de máquinas da Vale Wagner Silva, de 39 anos. Ele trabalhava em um local acima da barragem, mas, no dia do rompimento, precisou fazer um exame médico e aproveitou para almoçar. Por isso acabou sendo atingido pela lama de rejeitos.
Os bombeiros conseguiram encontrar apenas uma parte do corpo de Silva. “Ligaram para mim no dia 10 de maio dizendo que não tinham encontrado o corpo dele inteiro, mas que tinham encontrado parte dele. Eu falei ‘Você pode me dizer o que encontrou dele’. Disseram que era a perna direita”, conta a mãe do operador, Arlete Silva.
As outras partes do corpo de Wagner Silva não foram encontradas. Mas as buscas por ele e pelas outras “joias” de Brumadinho continuam.
Seis pessoas seguem sem identificação
As vésperas dos três anos do rompimento da barragem da Vale em Brumadinho, na região metropolitana de Belo Horizonte, a perícia conseguiu identificar a 264ª vítima da tragédia. Outras seis pessoas seguem sem identificação e não há previsão para fim das buscas pelos desaparecidos.
- Cristiane Antunes Campos
Cristiane trabalhava na mina Córrego do Feijão quando a barragem 1 da mineradora Vale estourou
- Luis Felipe Alves
Luis Felipe era engenheiro de produção e trabalhava na Vale havia três meses quando a barragem se rompeu. Em novembro de 2015, ele ajudou os bombeiros no rompimento da barragem da Samarco, em Mariana, a 110 km de Belo Horizonte
- Olímpio Gomes Pinto
Olímpio era funcionário de uma empresa terceirizada da Vale. Ele trabalhava na barragem no momento do rompimento
- Tiago Tadeu Mendes da Silva
Tiago havia acabado de se formar e trabalhava como mecânico industrial na Vale. Ele deixou dois filhos pequenos
- Maria de Lurdes da Costa Bueno
Maria de Lurdes não trabalhava no local. Ela passava férias com a família na Pousada Nova Estância. O local foi soterrado pela lama de rejeitos. Ela é a única pessoa que estava no local e ainda não foi encontrada
- Nathalia de Oliveira Porto Araújo
Nathalia estava fazendo estágio havia oito meses na Vale. Ela tinha duas filhas pequenas, de 3 e 4 anos
Por R7